05/03/2011

Casarões da Brigadeiro enfrentam decadência

Reportagem da Folha.com para mostrar o mau estado de conservação desses casarões e dizer que não basta tombar, é preciso incentivo para manter uma obra arquitetônica como essas em perfeitas condições.

VANESSA CORREA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Construídos na virada do século passado, muitos dos casarões em estilo eclético da avenida Brigadeiro Luís Antônio, no trecho que corresponde ao bairro da Bela Vista, centro de São Paulo, estão em franca decadência.

A maior parte desses casarões hoje é tombada pelo patrimônio histórico. Mas a medida, que por um lado impediu que fossem demolidos para dar lugar a estacionamentos e prédios ou que fossem descaracterizados, não os protegeu da degradação.

Na famosa avenida, na esquina com a rua Santa Madalena, um casarão que abrigava uma escola de inglês está desocupado há três anos.

Nesse meio tempo, foi invadido, desocupado e seu estado de conservação piorou muito. O forro de gesso da cobertura de suas varandas está se soltando, assim como placas do reboco da fachada.
Embora o imóvel esteja em região comercial e valorizada, e possa ser modificado por dentro se a fachada for mantida, ainda não apareceu empresário interessado em pagar R$ 1,7 milhão para ter seu negócio ali.

Bem em frente, mais um casarão tombado. Fechado e à venda há dois anos, está com janelas e reboco deteriorados. Parte do piso térreo já serviu de garagem para o hotelzinho ao lado, hoje também fechado. Casarão e hotel saem por R$ 2,5 milhões.
O número 1.234, com belos gradis em estilo vitoriano nas varandas, também tombado, está fechado e começa a perder a forma. Comerciantes da região dizem que o local abrigou uma clínica.

BALANÇO

A Folha percorreu a avenida e fez um balanço de como se encontram os casarões da Brigadeiro, entre a rua 13 de Maio e o viaduto Jaceguai.
Dos 18 casarões e sobradões encontrados, 9 têm proteção do patrimônio histórico. Onze abrigam comércio e serviços, mas parte foi descaracterizada. Um sobrado permanece original, com uso residencial. Cinco estão fechados e degradados, dois deles à venda.
Além disso, quatro estacionamentos funcionam onde antes havia casarões. Em alguns, gradis em ferro fundido e colunas com capitéis ainda podem ser vistos como ruínas dos antigos imóveis. Apenas um imóvel está completamente restaurado.
É o chamado Castelinho da Brigadeiro, no número 826.

Projetado em 1909, é um raro exemplo de arquitetura residencial em estilo art nouveau na cidade. Permaneceu com placa de aluga-se por cerca de seis anos. Hoje funciona como espaço para eventos.

Entorno também se degrada, diz professora da FAU-USP

Imóveis são de época de menor diferença social
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A Bela Vista, onde está a avenida Brigadeiro Luís Antônio, é representativa de uma época em que brasileiros e imigrantes de classes sociais distintas conviviam em um mesmo espaço, e a cisão entre rico e pobre era menor, diz Ana Lúcia Duarte Lanna, historiadora e professora da FAU-USP. Leia trechos da entrevista. (VC)

Folha - Qual é a relação dos casarões da Brigadeiro com a história da cidade?
Ana Lúcia Duarte Lanna - Eles mostram um período de ocupação e do crescimento da cidade, quando, pela primeira vez, tinha influências de origens muito diferentes. A cidade cresce muito, e os casarões começam a ser construídos principalmente no início do século 20.

Qual é o estilo arquitetônico desses imóveis?
São todos de uma ocupação que genericamente se chama de ecletismo. Mas eles são diferentes. Uns são mais imponentes, outros menos.
É um lugar que mostra uma cidade onde as diferenças sociais, o mais endinheirado, o menos endinheirado, o imigrante, a família tradicional, as ordens religiosas, conviviam no mesmo espaço. Não tem essa coisa tão cindida, o lugar do rico e o lugar do pobre.

Por que os imóveis com esse valor histórico não permanecem conservados?
Os estímulos são considerados insuficientes pelos proprietários e o poder público não tem condição e acha que nem teria motivo para restaurar, recuperar e dar uso. O que tombar já é uma discussão complicada. Mas depois, como dinamizar, como garantir o uso, aí é uma questão difícil em qualquer lugar. É uma reforma cara.
Mas eu acho que esse lugar da Brigadeiro é bacana porque tem tantas possibilidades, tantas coisas interessantes, e ele não vai, né? E isso dá uma sensação de degradação não só para o imóvel, mas para o entorno todo.

Fonte e fotos: Folha.com