A mais recente edição da Bienal de Arquitetura de Veneza situa-se entre mostra de artes e feira de ciências. Em seus espaços expositivos, multiplicam-se esculturas e experimentos que procuram traduzir ou dar respostas a questões prementes de um futuro próximo, relacionadas sobretudo à interface do indivíduo com o meio. Nesse contexto, o design é visto como ferramenta primordial aos novos tempos preconizados pelo evento.
Trata-se, em síntese, de criar soluções relacionadas a produtos ou a serviços que tornem ecologicamente responsável e socialmente amigável o convívio entre toda a ordem de diferenças culturais e comportamentais mundo afora. E, no mesmo caminho, a proposta é repensar o meio que habitamos, desde o programa de nossas casas (sejam elas unifamiliares ou multifamiliares) e os objetos nelas contidos até sistemas domésticos capazes de diminuir o impacto ambientalmente negativo dos acúmulos coletivos de nossa existência. Lirismo, ecologia e certa dose de bom humor estão na ordem do dia desta bienal.
São atributos que permeiam as mais diversas exposições, desde a instalação principal - Out There: Architecture Beyond Building, com curadoria de Aaron Betsy - até as participações nacionais. O discurso da mostra parece ter mudado na direção de um olhar compartilhado com outras áreas de conhecimento, com os não-arquitetos, com gente das ciências e das artes ou, simplesmente, com os moradores anônimos das cidades.
Portanto, nada de expor centros culturais ao longo dos pavilhões, nada de estatísticas relacionadas a deslocamentos urbanos ou referências ao vocabulário formal e contemporâneo da arquitetura, para citar alguns dos debates levantados durante as duas edições anteriores do evento.
É hora de voltar a atenção às casas e aos indivíduos, vistos na condição de um grande laboratório de ensaios que não aceita isoladamente a idéia da arquitetura e do urbanismo como a arte e a técnica de projetar cidades e edifícios. É necessário algo a mais para que se crie a arquitetura em processo, conceito em voga nesta bienal. É preciso, portanto, o aporte do design para que surjam os ambientes, objetos e sistemas representativos de novos programas, individualidades, formas de existência e necessidades.
A começar pela participação dos designers holandeses do escritório Droog Design no espaço Singletown, inspirado por estatísticas que indicam que nos próximos dez ou 20 anos vai duplicar o número de lares com apenas um ocupante. Como moram essas pessoas, quem são elas, de que maneira se comportam? A equipe da Droog, em parceria com a agência de comunicação KesselsKramer, elencou nove tipos, nove personagens que se organizam em alguns conjuntos principais: o executivo com excesso de trabalho e sempre em trânsito, o eterno estudante, o comissário de bordo, o que trabalha em casa, o solteiro convicto e o recém-divorciado.
Os objetos reunidos em Singletown são a extensão de hábitos e preferências pessoais: o armário em que mangueiras plásticas fazem as vezes de prateleiras, a fim de possibilitar certa desordem de roupas e acessórios; a divisória que armazena objetos utilitários compartilháveis entre residências contíguas; a poltrona retrátil que se projeta pela janela a fim de alcançar o ar fresco e o banho de sol; ou o assento climatizado, que prescinde do aquecimento de todo o ambiente.
A participação brasileira, em sintonia com o tema, reúne depoimentos em que pessoas das mais variadas atividades revelam sua leitura em relação à arquitetura. Há desde casas feitas com resíduos luxuosos de desfiles de carnaval até reminiscências da infância.
A curadoria, de Roberto Loeb, parece ter conquistado a aprovação do público, que já nos primeiros dias da mostra preencheu boa parte dos livros de observações com depoimentos favoráveis.
Na outra ponta das discussões está o tema da sustentabilidade, e é assim que a bienal alcança toda a sua riqueza conceitual. Surpreendentemente, são exibidos inúmeros projetos, hipotéticos ou em processo de implantação, que abrangem da autonomia auto-sustentável de edifícios ou grupos de residências nas cidades até as mais diversas formas de reciclagem.
Estas, afinal, assumem a forma de interessantes reapropriações culturais mundo afora, na medida em que recolocam em cena objetos que são quase ícones modernos e contemporâneos. Estão lá caixas de leite revestindo paredes de uma antiga estação ferroviária nunca concluída, assentos de aeronaves transferidos para o ambiente doméstico, pneus de carros reutilizados em bancos públicos. Vale a pena conferir, nesse contexto, os projetos do coletivo virtual Superuse (www.superuse.org). A Bienal de Arquitetura de Veneza teve início em 14 de setembro e permaneceu em cartaz até 23 de novembro de 2008.
Fonte: Revista Projeto http://www.arcoweb.com.br/design/design104.asp
Foto: uma das instalações, chamada Singletown - Revista Projeto http://www.arcoweb.com.br/design/fotos/104/ft1.jpg
Adorei seu blog !
ResponderExcluirCom certeza irei acompanhá-la daqui pra frente.
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